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Crônica

Grão
Sérgio Napp

E quando se amaram de fato não houve mais jeito.

Mesmo que resistissem àquele amor, aquele amor tornou-se mais forte que eles. E os embalou como se estivessem no meio do oceano num barco de papel. E as ondas os levavam do dia para a noite, da noite para as estrelas, das estrelas para o infinito.

E nem houve tréguas. O amor os consumia como se carregassem um vulcão e nenhuma chuva, nenhuma tempestade, nenhum tsunami conseguiria apagar aquele fogo.

Léguas que andassem e a paisagem seria a mesma, eternamente a mesma: uma árvore copada, florida de todas as flores conhecidas, de todos os matizes, de todas as formas, e sob esta árvore descansariam do encantado fardo que carregavam: o amor.

Feito crianças travessas, traquinas, alegres, divertidas, carentes, entusiasmadas, risonhas, palpiteiras, olhos brilhantes, risos de pôr-do-sol, sempre se amariam, descobrindo em si o jogo mais perfeito e o gozo de jogar.

Caso seus caminhos se desencaminhassem, perdendo-se pelos tempos em artimanhas de desamor; caso fossem seres pequeninos, premidos pelas circunstâncias, presos aos instintos; mesmo assim, famintos, mesmo assim, encantados, mesmo assim, lindos, cristalizariam a sua alegria no ato de amar.

E cada uma de suas palavras era amiga e transparente, pequena e colorida; leve feito ave, em paz consigo mesma; travessa e divertida. Seu teto, o afeto; seu chão, o coração. Chegava de mansinho, falando só de carinhos, e, mais que uma palavra, era um feixe de emoções, um riso cristalino, um sol de fevereiro, primeira e derradeira, tão simples e completa que se bastava. Ah, que essa palavra os embalava em suas noites de lua quando as estrelas vinham adormecê-los.

Traziam em seus olhos navios que nunca se perdiam das rotas; em suas mãos, avisos de eternas manhãs. A todos encantavam com sua paixão e, de tanto amar, dançavam pelos telhados dos corações. Nunca ninguém entendeu, mas por ser este amor demais colhiam, no espinheiro, uvas da paz.

Feito um turbilhão, uma canção que não tivesse fim, o amor tomou posse. Feito uma aflição que não tivesse solução e roesse o coração, o amor se instalou. Tomou-os de assalto, deles fez morada e alimento. Sem pedir licença, sem pagar ingresso, o amor transformou-se neles. Poderiam, então, acender as velas da manhã iluminando o mundo e mudar a cor do mar se quisessem; poderiam acalmar os vendavais da noite abrigando seus náufragos e fariam da água, vinho, se quisessem; poderiam apascentar os preguiçosos dias de verão agasalhando as cigarras e suas canções, se quisessem; poderiam acrescentar um pouco de luz às estrelas marinhas e alinhar os planetas se quisessem; tudo era possível por aquele amor.

Juntos, por mais que se amassem, mais se amariam; por mais que se dessem, sempre se dariam; até que fosse o dia em que se fariam sal da terra, sal; luz do mundo, luz; um, e apenas, grão.


05/11/2009

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Comentários:

Sempre MUITO BOM te ler. ... Seu teto, o afeto; seu chão, o coração. Tuas palavras, tua sensibilidade. Adorei. Parabéns. Abraços da sempre amiga
Maira Knop, Porto Alegre - RS 06/11/2009 - 13:03

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  Sérgio Napp

Sergio Napp, nascido em Giruá/RS em 03.07.39, é engenheiro civil, escritor e letrista. Premiado em festivais de música no Rio Grande do Sul, São Paulo e Rio de Janeiro, tem mais de cem trabalhos gravados por artistas locais, nacionais e internacionais, sendo autor de um dos clássicos do regionalismo gaúcho, Desgarrados, em parceria com Mário Bárbara. Foi Diretor da Casa de Cultura Mario Quintana entre 1987/1991, 1997/1998 e 2003/2007, tendo coordenado a equipe responsável pela reciclagem do Majestic Hotel em Casa de Cultura Mario Quintana.

sergionapp@terra.com.br
www.sergionapp.com


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