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Literatura

Da arte da palavra ao prazer da leitura
Sérgio Napp

Com tempo ruim,
todo mundo também dá bom dia.
Gonzaguinha

O primeiro alimento é a palavra. Da concepção ao nascimento ela agasalha, reconforta, acarinha: conta do frio e do calor, do inverno e do verão, do medo e da alegria. Diariamente relata, passo a passo, músculo a músculo, o transcorrer da vida.

A primeira palavra balbuciada é alimento para os que nos cercam. Há quem a grave, quem a escreva, quem a conserve ao longo de todos os tempos. É como se fosse um aviso, um prenúncio, a suprema revelação.

Cada palavra é única. Ninguém há de sabê-la melhor que nós. Pede abrigo, pede pouso, comida e roupa lavada. E, se não nos precavermos, água Perrier.

Toda palavra nos ferra. Com sua marca indelével nos lembra o silêncio dos entardeceres. Destino, punhal suspenso na esquina do coração. Estrela que se esqueceu de nascer.

Por vezes perdemos o rumo, tantas são as palavras nas terras em que se lavra o duro ofício de ser. Então é preciso vigiar dia e noite em busca das que nos revelem: como se quebra o gelo dos homens, como se sangram novos caminhos, como se aprende a crescer?

Palavras são brinquedos de armar.

Vejamos uma que indique sentimento, dor; e outra, que passe a idéia de vento, de alento, ventilar. Da mistura das duas pode-se ter ventilador. O ventilador ventila a dor? A dor que o ventilador ventila é a dor do calor? Não seria ventilacalor? E o que dizer do espanador? Ou do ralador?

Todos conhecem e cantam,
O meu boi morreu
que será de mim...

mas, e se alguém trocar uma única letra, criando uma nova palavra,

O meu boy morreu
que será de mim...,
quantas leituras faremos a partir de então?

A palavra é pulsante, ardilosa em suas teias de horizonte, difícil domá-la na arena do papel.

Cabe dissecá-las, acariciá-las. Cabe imaginá-las, aquí e ali, dependuradas à frase.

Pode-se escrever no colo da vida? É confortável? Ou estará coberto de espinhos...

Doce de chuchu lambuza a alma? Um bule esmaltado fareja as manhãs? Lâminas de sal ferem? A pele do tempo sufoca? Que pássaros migram dos olhos da amada? Um céu de infinitos possui tímpanos de prazer? E as roupas sonolentas nos varais, quem as terá colocado? Os dardos da angústia prevalecem? Quem fez o laço dos moinhos e deitou-se no ventre das pedras? A tarde é uma interrogação?

O grão se faz à medida para que a palavra exploda e o menor de seus fragmentos é vida.

Que pode oferecer o que trabalha a palavra, a não ser a própria palavra retransformada em casa, beijo, prego, anzol ou pedra de rio?

A palavra arde; a palavra fere, mastiga, tritura; a palavra brota; a palavra é grão; a palavra explode em veludo.

Carpir silencioso onde sequer a voz alcança, ventre onde o som debulha notas de trigo, a palavra gera.

Seremos dignos dela?

15/04/2008

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  Sérgio Napp

Sergio Napp, nascido em Giruá/RS em 03.07.39, é engenheiro civil, escritor e letrista. Premiado em festivais de música no Rio Grande do Sul, São Paulo e Rio de Janeiro, tem mais de cem trabalhos gravados por artistas locais, nacionais e internacionais, sendo autor de um dos clássicos do regionalismo gaúcho, Desgarrados, em parceria com Mário Bárbara. Foi Diretor da Casa de Cultura Mario Quintana entre 1987/1991, 1997/1998 e 2003/2007, tendo coordenado a equipe responsável pela reciclagem do Majestic Hotel em Casa de Cultura Mario Quintana.

sergionapp@terra.com.br
www.sergionapp.com


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